sábado, 15 de março de 2014


Meu top ten dos clássicos do pensamento político

Os clássicos do pensamento político, que são de leitura extraordinariamente agradável constituem uma linguagem referencial. Os livros aqui listados estão disponíveis em uma variedade de edições:

1) Platão. República
2) Aristóteles. Política
3) Maquiavel. O príncipe
4) Hobbes. Leviatã
5) Locke. Segundo Tratado de Governo
6) Rousseau. O contrato social
7) Burke. Reflexões sobre a revolução em França
8) Stuart Mill. Da liberdade
9) Marx e Engels. Manifesto do Partido Comunista
10) Tocqueville. Da democracia na América
O grupo de estudos Reflexões do Brasil que já completou quatro anos de existência tem como meta nesse ano de 2014, ler, pelo menos, 4 obras. 

1 Fernando Henrique Cardoso - Os pensadores que inventaram o Brasil (lido) 
2 Paulo Prado Retratos do Brasil (próxima leitura)
3 Sérgio Buarque de Holanda - Raízes do Brasil (lido)
4 Gilberto Freyre - Casa grande e senzala (lido)
5 Darcy Ribeiro - Povo brasileiro (lido)
6 Raymundo Faoro - Os donos do poder (lido)
7 Caio Prado Júnior - Formação do Brasil Contemporâneo (lido)
8 Gilberto Freyre - Ordem e Progresso
9 Caio Prado Júnior -História Econômica do Brasil (próxima leitura)
10 Luiz Bresser Pereira - Desenolvimento e crise no Brasil
11 Luiz Bresser Pereira - Economia brasileira - Uma introdução crítica
12 Caio Prado Júnior - História e Desenvolvimento
13 Gilberto Freyre - Sobrados e Mucambos
14 Florestan Fernandes - A integração do negro à sociedade de massas
15 Sérgio Buarque de Holanda - Visão do paraíso
16 Jacob Gorender - O escravismo colonial
17 Celso Furtado - Formação Econômica do Brasil
18 Capistrano de Abreu - O descobrimento do Brasil
19 Nelson Werneck Sodré - Introdução à revolução brasileira
20 Robert Simonsen - História Econômica do Brasil
21 Nelson Werneck Sodré - Introdução à revolução brasileira
22 Fernando Henrique Cardoso - Capitalismo e escravidão no Brasil meridional - o negro na sociedade escravocrata do Rio Grande do Sul
23 Manuel Bonfim - O Brasil Nação
24 Manuel Bonfim - O Brasil na América
25 Joaquim Nabuco - Minha formação (lido)
26 Joaquim Nabuco - O abolicionismo (lido)
Prefácio de minha obra que será lançada - se tudo der certo em abril - 

Prefácio –Tese de Doutorado – José Renato Ferraz da Silveira – PUC/SP


William Shakespeare e a teoria dos dois corpos do rei: a tragédia de Ricardo II

Entre os séculos XIV e XVII a Inglaterra imaginou e/ou experimentou instituições sociopolíticas que seriam decisivas em diversos quadrantes geográficos em períodos ulteriores, inclusive o contemporâneo. Os tempos ali sentidos, tanto no que concerne à Idade Média quanto à Moderna, nas suas conexões histórico-simbólicas, auxiliaram na definição – talvez como em nenhum outro lugar – dos traços predominantes do Ocidente liberal, e que viria também a se tornar democrático posteriormente. Nunca é demais, portanto, quando para lá retornamos e buscamos conhecer mais e melhor o seu caráter.
O professor José Renato Ferraz da Silveira, do Curso de Relações Internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), dando sequência a uma pesquisa que já rendeu bons frutos quando da publicação de sua dissertação de mestrado na forma de livro[1], dá a conhecer, agora, a sua tese doutoral, defendida junto à PUC/SP, também na forma de livro: William Shakespeare e a teoria dos dois corpos do rei: a tragédia de Ricardo II. Sim, os termos sugerem proximidade temática, mas a complexidade que cada empreendimento oferece é ímpar. Veja-se a passagem a seguir, na qual o prefaciador daquele livro e orientador acadêmico de Silveira, professor Miguel Chaia (p. 13), discorre sobre o autor e sua obra:

Este livro [A Tragédia da Política em Ricardo III] é uma ousadia intelectual e um instigante produto acadêmico. José Renato faz parte de um grupo de intelectuais que percebeu na contemporaneidade a complexa relação entre as áreas de saber e busca borrar as fronteiras que compartimentam a inteligibilidade do mundo. Nesse sentido, o autor supõe que também a arte – como a filosofia e a ciência – é um exercício de pensamento e criação capaz de gerar diferentes formas de conhecimento. Especialmente, no caso deste livro, o autor seleciona peças de William Shakespeare para realizar uma investigação das relações de poder, problematizando questões clássicas que envolvem a sociabilidade humana.

Exatamente o mesmo pode ser consignado em relação ao documento que ora vem a público. No entanto as diferenças (entre as obras) não se limitam ao rei estudado: em Ricardo II (1367-1400), cujo reinado compreende o intervalo temporal de 1377 a 1400, explora-se a teoria dos dois corpos do rei (The King’s Two Bodies), formulada pelo historiador medieval alemão Ernst Hartwig Kantorowicz[2] (1895-1963). Uma abreviadíssima síntese de sua erudita pesquisa: postula este autor que, entre as teorias que conferiam sustentação legal e divina aos poderes reais no medievo, aquela que identificava uma dupla dimensão no corpo real merece ser sobrelevada. Em específico: o rei não teria apenas “um corpo”, mas sim dois; um natural, à semelhança de qualquer ser humano; e outro místico, dotado, por conseguinte, de características especiais. O primeiro estaria sujeito à morte; o segundo jamais morreria. Neste caso, a majestade da excelsa posição seria transferida para outro corpo, remanescendo a simbologia. Observe-se, ademais, que essa teoria conhecerá especial aceitação na Inglaterra absolutista do século XVI, a do chamado “período elisabetano”.
Não parece ser sem sentido a opção de Silveira em inaugurar o seu trabalho com um capítulo esclarecedor sobre o reinado de Elisabeth (1558-1603). Veja-se que é no final do governo da “rainha virgem” que Shakespeare produzirá o seu Ricardo II (1595-1596). O tempo, aqui, demonstra-se elástico: ao narrar (e criticar) a conduta de um rei apeado do poder, o bardo parece manifestar preocupações políticas contemporâneas a si. A propósito, no segundo capítulo Silveira volta a examinar o contexto histórico em que Shakespeare produz. O longuíssimo período de poder daquela que foi considerada a fundadora do moderno império inglês foi prenhe de tensões (e de conspirações). Ao auscultar historicamente um período anterior, Shakespeare ilumina o seu – sem prejuízo às luzes lançadas sobre os tempos vindouros.
A Inglaterra – ou melhor, o que viria a ser a Inglaterra – no último quartel do século XIV denotava salientes evidências medievais. Dois grupos sociais eram francamente majoritários em uma formação societária marcadamente rural: proprietários de terras e camponeses. A Casa Real, desfrutante de todo o arcabouço simbólico creditado às elites nobiliárquicas, já respondia a pressões advindas de um Parlamento iniciado nas reivindicações por poder – lembrem-se as diferenças entre o rei João Sem-Terra, os barões e o Papa, em 1215, quando da escritura da Magna Charta Libertatum. Este é o ponto: Ricardo II torna-se rei legitimamente (era herdeiro do trono), mas, no decorrer de sua governança, em face de erros políticos continuados, é subtraído de sua condição real. A deposição de Ricardo II, bem como todo o quadro de crises que caracterizaram o seu reinado, constituem o mote para que Shakespeare reflita sobre a política, a condição humana do político e o poder – em uma perspectiva trágica, bem compreendido – de modo potencialmente universal.
Shakespeare prescreve a ordem porque diagnostica a desordem. Uma vez mais, Silveira desfila acuro analítico ao posicionar o artista britânico em um espaço de confluências entre “clássicos”, como Platão e Aristóteles, e “modernos”, tais como, Maquiavel, Hobbes, Locke e Weber. Todos eles, cada um a seu modo – e sem o descuro da inflexão teórica promovida pelo “gênio florentino”, cujo edifício erigido com O Príncipe permitiu a autonomia da política –, ao homenagearem o realismo (em seus diversos matizes), contribuíram à compreensão da política e da miséria humana que lhe é ínsita. Desdobramento lógico: a ordem social traveste-se em uma quimera – e o exercício da política um exasperante movimento que ousa conciliar arte e técnica. O poder não somente se alimenta da alma dos que o controlam; ele requer habilidades humanas que são, certamente, encontráveis em poucos – e que estão dispostos a fazer o que é preciso fazer.
Com o subsídio teórico de Max Weber, Silveira mobiliza uma díade conceitual estruturante na política: o princípio da legalidade e a lógica da legitimidade. O primeiro é condição necessária (e adequada), mas não suficiente à unção no (e mantença do) poder; a severa atenção à segunda mitiga o dilema da instabilidade da anuência, caracterizadora de qualquer relação entre governante e governados. Ricardo II, com a sua contumaz inabilidade na condução dos negócios do Estado, maculou a aura circundante aos reis. E, com isso, o último dos Plantagenetas, antes de ser destituído do trono por seu primo, Henrique Bolingbroke, bem como pela parte da nobreza que a este apoiava, deslegitimou-se à condição real. Assiste-se, dessa forma, não somente à deposição de um rei, mas desconstituem-se os fundamentos de uma das teorias que suportaram a institucionalidade europeia no medievo: a teoria dos dois corpos do rei começava a ruir; os valores modernos iniciavam a corroer os seus equivalentes medievais.
Vislumbram-se, assim, os planos que interagem na obra de Silveira: um autor contemporâneo (século XXI) se debruça sobre uma peça shakespeariana (final do século XVI), que, de sua parte, com o possível intento de metaforizar o reinado de Elisabeth, retrata um drama histórico-político da segunda metade do século XIV. Não é necessário recorrermos às exigências vergastadas por Quentin Skinner[3] a uma boa recuperação de um tempo pretérito – a saber, erudição à farta na apreensão dos significados dos termos dos debatedores daquele contexto – para reconhecermos a coragem incomum do professor José Renato no tratamento dado aos seus temas estudados. O que se depreende de sua obra (em tempo: de agradabilíssima leitura) – e que certamente o aproxima de perspectivas shakespearianas – é uma possibilidade que a todos fascina: os indivíduos teimam em não ser escravos de seu contexto de formação, ceteris paribus, parece ser necessário reconhecermos componentes constantes nas nossas condutas. O exame da política – assim como o de seu sujeito, o político –, em sua dimensão agônica e universal, apresenta-se como um bom caminho.


Reginaldo Teixeira Perez
Santa Maria/RS, outubro de 2013.



[1] SILVEIRA, José Renato Ferraz da. A Tragédia da Política em Ricardo III. Rio de Janeiro: Beco do Azougue, 2012.
[2] KANTOROWICZ, Ernest H. Os Dois Corpos do Rei: um estudo sobre teologia política medieval. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
[3] SKINNER, Quentin. Meaning and Understanding in the History of Ideas. In: James Tully (Ed.). Meaning and Context: Quentin Skinner and his Critics. Cambridge: Polity Press, 1988. p. 29-67.
Eis um material produzido pelo Núcleo Prisma que me orgulho pela qualidade e rapidez no empreendimento: 

APRESENTAÇÃO

                O Núcleo PRISMA (Pesquisas em Relações Internacionais de Santa Maria), através do Grupo de estudos “Reflexões do Brasil”, promove o presente material didático em caráter ensaístico acerca do Brasil da década de 20. Com o propósito de “revelar” o Brasil sob o ponto de vista rigorosamente atual na escultura, arquitetura, música e literatura, percebemos, nesse período histórico, a efervescência dos movimentos sócio-políticos que se descortinam na revolução de 30, inaugurando um novo Brasil.
                A Semana de Arte Moderna, realizada entre 11 e 18 de fevereiro, contou com a participação de escritores, músicos, artistas, arquitetos de São Paulo e do Rio de Janeiro. Do comitê patrocinador, tendo à frente Graça Aranha, faziam parte, entre outros, Paulo Prado, Alfredo Pujol, Renné Thiollier e José Carlos Macedo Soares. Entre os participantes, cuja presença se anunciava, figuravam músicos como Villa Lobos, Guiomar Novais, Ernani Braga e Frutuoso Viana; escritores como Mário de Andrade, Ronald de Carvalho, Álvaro Moreira, Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, Renato de Almeida e Plínio Salgado; artistas plásticos como Vítor Brecheret, Haarberg, Anita Malfatti, Di Cavalcanti. O evento teve desde o início grande divulgação. Embora não faltasse quem se opusesse a sua concretização.
                O certo é que a Semana tinha o objetivo de renovar o ambiente artístico e cultural de São Paulo e do país, tentando libertar a arte brasileira das amarras que ainda vinculavam à Europa. Esse acontecimento cultural da maior significação ultrapassou o campo artístico e repercutiu inclusive na área política.
                Conforme Chaia (2007, p. 7), “arte e política: trata-se de um paradoxal encontro, no qual as partes envolvidas estabelecem instáveis equilíbrios, porém, sempre de fortes intensidades”.
                A incômoda reunião e a surpreendente união entre arte e política reiterada por Chaia permeia o sentimento de insatisfação e inconformismo – e a busca de uma nova linguagem dos artistas e intelectuais da Semana de Arte Moderna de 22 – que representam um desejo de renovação do Brasil. Temas como o índio, a valorização da tradição nacional ou a procura do espírito do povo, são consequências desse sentimento de perturbação.
                Perturbar e instigar a reflexão do leitor em torno do que representa a década de 20 para o pensamento brasileiro, sob diversos aspectos – econômico, sociológico, político, artístico - é o propósito desse breve ensaio.

Os autores




Se a função do diplomata é representar o país perante Estados estrangeiros e foros internacionais, o oficial de chancelaria presta apoio técnico às tarefas diplomáticas e consulares. Entre suas atribuições estão incluídos planejamento, supervisão, orientação, controle e execução de serviços técnicos relacionados ao cerimonial, práticas consulares, acordos e atos internacionais, cooperação cultural, cooperação técnica, científica, tecnológica e comercial.
O assistente de chancelaria, por sua vez, presta apoio administrativo aos servidores da carreira diplomática, ao Itamaraty e à Secretaria de Estado das Relações Exteriores, às missões diplomáticas e às repartições consulares. As atividades da função abrangem tarefas de secretariado, taquigrafia e processamento de dados, cerimonial, cooperação cultural e cooperação técnica.

postagem de 2012

Leonardo Augusto Peres

A eterna primavera brasileira

A política externa brasileira tem um histórico de resolução pacífica de conflitos. Com exceção da Guerra da Tríplice Aliança (ou Guerra do Paraguai) e de uma participação, apesar de importante, diminuta na Segunda Guerra Mundial, durante a qual o país tomou vitoriosamente o Monte Castelo, não se tem, em geral, memórias do Brasil em frentes de batalha. Modernamente, o país é líder de uma missão no Haiti, mas essa é, justamente, uma missão de paz sob o mandato das Nações Unidas. Assim, a história brasileira mais lembrada não é bélica, mas sim diplomática, como, por exemplo, a atuação do Barão de Rio Branco.
Esse clima de paz é o contrário do que se observa, presentemente, internamente nos países árabes que passam pela chamada “Primavera Árabe”. Nesses países, a população civil viu-se em precárias situações econômico – devido, em parte, à crise mundial e geral do capitalismo, e em parte à elevação dos preços dos alimentos –; políticas – tendo em vista que esses países são monarquias ou ditaduras, e não democracias –; e sociais – levando em consideração a repressão sofrida pelas pessoas. Era a situação na Líbia, onde a população revoltou-se, mas a reação violenta do governo ditatorial de Kadafi gerou uma verdadeira guerra civil.
Em vista dessa situação, o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas, único órgão internacional com competência para tal, autorizou o uso da força contra o governo da Líbia para que este deixasse de massacrar a população civil (os rebeldes). O fato de que o bombardeio sobre cidades líbias levou, ao fim e ao cabo, à troca de regime de governo no país, é passível de uma análise própria. No que tange a posição brasileira, atual membro rotativo do Conselho de Segurança, o que passou foi que nosso país condenou a postura do governo Kadafi, porém se absteve de votar o uso de força contra seu governo.
A Síria foi outro país que testemunhou a Primavera Árabe, com características semelhantes à situação da Líbia. A presença de uma ditadura, a ausência de uma constituição efetiva, o desemprego e a corrupção no governo levaram a população civil a realizar uma série de protestos, que consistiram desde a autoimolação e guerras de fome até enormes manifestações. O objetivo era derrubar o ditador Bashar al-Assad, implementando uma troca de regime e reformas democráticas, além de obter mais direitos civis, reconhecendo as minorias e levantando o estado de sítio sírio. O governo da Síria reagiu expulsando a população da rua com tanques e franco-atiradores, confiscando alimentos e cortando o acesso do povo à água e à energia.
A reação brasileira ao caso sírio foi diferente daquela seguida quanto à Líbia, apesar da situação ser tão semelhante e parte de uma mesma conjuntura ampla, a Primavera Árabe. O Brasil não repreendeu Bashar al-Assad. Apenas deu suporte a uma declaração da Organização das Nações Unidas criticando o ditador, porém somente com certa demora, após o massacre da população ficar evidente. Ademais, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil fez parte de uma missão, juntamente com Índia e África do Sul, que foi dialogar com al-Assad, enquanto as tropas do ditador assassinavam civis. Após esse diálogo, o Brasil assinou uma declaração pedindo o fim da violência por parte de todos os envolvidos no conflito sírio, de ambos os lados, conforme relata a Folha de São Paulo.
O editorial desse mesmo jornal busca classificar essas diferentes respostas da política externa brasileira como certa, no caso da Líbia, e errada, no caso da Síria. Porém, desde Maquiavel tem-se claro que não há uma moralidade específica do ato político. Assim, a única classificação que se pode fazer dessas ações brasileiras é se elas são ou não condizentes com a política externa do país, historicamente. Relembrando o que foi exposto no primeiro parágrafo, de que essa política externa tem tendência pacífica, afirma-se que ambas as ações são coerentes. No caso da Líbia, o Brasil absteve-se de apoiar uma resolução que se utilizaria da força para tentar sanar o problema daquele país. No caso da Síria, a chancelaria brasileira optou por ouvir o lado acusado do conflito, prover uma oportunidade de defesa, em especial sendo al-Assad, pelo menos juridicamente, ainda autoridade naquele país. Nos dois casos, portanto, o Brasil seguiu sua política externa diplomática e pacífica.
Tendo em vista essa vocação pacifista e democrática da política externa brasileira, não surpreende a importância que é dada aos direitos humanos nas relações internacionais do Brasil. Isto está posto, inclusive, no artigo 4° da Constituição Federal, que lista a “prevalência dos direitos humanos” como um dos eixos norteadores das relações exteriores de nosso país. Roberto Abdenur diferencia esse princípio dos outros listados no mesmo artigo da Carta Constitucional, como o da “autodeterminação dos povos” ou o da “não intervenção”, como sendo um “imperativo de ordem moral” contra as “normas de comportamento” que ele considera serem estes outros princípios. Porém, como já se disse, não há moralidade na política, conforme apontou Maquiavel. Desta maneira, a importância dada aos direitos humanos não ocorreria por serem considerados imperativos morais, mas sim por serem uma série de princípios imprescindíveis à convivência pacífica entre as nações – e dentro delas, como a Primavera Árabe prova.
Mantendo essa postura pacifista – mas também cada vez mais participando de ações militares como a que lidera no Haiti – o Brasil busca um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU assim que a organização for reformada. Desta forma, assim como é dito que o Brasil é eternamente o país do futuro, eternamente também vive sua própria primavera, despertando para os diferentes assuntos internacionais sempre que estes tomam importância no contexto mundial, sempre prometendo ser uma nova potência no cenário global. A ONU, porém, não dá pistas de que tão cedo irá ser reformada, e o sonho de um assento permanente também se torna eternamente utópico. Com organizações tais como a OMC, o Banco Mundial e as regionais, como a OEA, o MERCOSUL ou a UNASUL possuindo cada vez mais importância relativa comparativamente à ONU, pode-se questionar, pois, se estratégias alternativas de inserção internacional do Brasil não seriam mais proveitosas do que esperar esse tão sonhado assento permanente.

Postagem de 2011

As mulheres representam menos de 10% dos líderes mundiais. Em nível global, menos de um em cada cinco parlamentares é mulher. O percentual crítico de 30% de representação feminina nos parlamentos foi atingido por apenas 28 países.
Em evento de alto nível, hoje (19/9), durante a 66ª sessão da Assembleia Geral da ONU, em Nova York, mulheres líderes políticas fazem uma chamada forte para o aumento da participação política e tomada de decisão em todo o mundo. Destacando que a participação das mulheres é fundamental para a democracia e essencial para o alcance do desenvolvimento sustentável e paz em todos os contextos – durante a paz, nos períodos de conflito e pós-conflito e durante as transições políticas, as líderes vão assinar uma declaração conjunta com recomendações concretas sobre as maneiras de promover e avançar a participação políticas das mulheres.
São signatárias: Presidenta do Brasil, Dilma Rousseff; Kamla Persad-Bissessar, primeira-ministra da República de Trinidad e Tobago; Hillary Rodham Clinton, Secretária de Estado dos Estados Unidos da América; Baronesa Catherine Ashton, Alta Representante da União Europeia para Negócios Estrangeiros e Política de Segurança e Vice-Presidente da Comissão Europeia; Roza Otunbayeva, Presidenta da República do Quirguizistão; Lilia Labidi, Ministra de Assuntos das Mulheres da República da Tunísia; Helen Clark, Sub-Secretário-Geral e Administradora do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento; e Michelle Bachelet, Sub-Secretária-Geral e Diretora Executiva, da ONU Mulheres – Entidade das Nações Unidas para a Igualdade de Gênero e o Empoderamento das Mulheres.
Guilherme da Cruz Backes

UMA BREVE REFLEXÃO ACERCA DA POLÍTICA ECONÔMICA DO COMEÇO DO SÉCULO XXI

Com a eclosão de inúmeros protestos em países europeus como Espanha, Grécia e Reino Unido, alguns questionamentos devem ser mencionados. Países que outrora contavam com economias desenvolvidas e mais bem preparadas para crises como à que estamos assistindo atualmente vem sendo palco de inúmeras reações – muitas delas, violentas – por parte de suas próprias populações.
Entrementes, o que pode ser concatenado e inferido dessa onda de insatisfação popular que arrasa o Velho Continente? Keynes, ainda na década de 1930, já discorria sobre a importância de métodos anticíclicos perpetrados pelo Estado para que as economias domésticas pudessem sair de períodos de recessão ou de depressão. O que mais surpreende, no entanto, é a utilização de formas anacrônicas por parte de certos governos para que suas respectivas economias voltem a patamares razoáveis de estabilização e de segurança.
Com o estímulo e o apoio de organismos internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI), testemunhamos cortes de gastos públicos, deterioração de serviços básicos e privatização de antigas estatais em grande parte da Europa. Tudo isso em nome da famigerada responsabilidade fiscal. Ora, se o estímulo a novos investimentos for neutralizado por tais medidas austeras, obviamente a economia desses países não voltará ao seu dinamismo anterior à crise, não contribuirá para o crescimento do comércio internacional e tampouco terá condições de honrar os empréstimos concedidos pelo Banco Central Europeu e pelas demais instituições financeiras.
Por outro lado, isso não quer dizer que o liberalismo deva ser atacado de antemão, conforme o fazem alguns diletantes da heterodoxia marxista. O fato é que para salvar o próprio sistema capitalista, muitas vezes a presença do Estado se faz necessária, diante de especulações financeiras, de pânico nas Bolsas de Valores e de demais comportamentos desencadeados por crises econômicas. Isso quer dizer, portanto, que nem sempre a ortodoxia do laissez-faire tem a capacidade necessária para estabilizar um período de turbulência, tal como o que presenciamos agora.
Por fim, o mais inusitado de tudo isso é o fato de as economias emergentes estarem mais bem preparadas para as atuais contingências econômicas do que as grandes potências do Norte. Com incentivos fiscais e investimento em setores estratégicos, o governo brasileiro, por exemplo, vem adotando uma alternativa completamente diferente do que se vê na Europa. Evidentemente, o governo brasileiro deve permanecer atento ao que acontece fora da América do Sul. Entrementes, se Keynes ou o Consenso de Washington é que estava certo, somente o tempo irá confirmar.

LANÇAMENTO DA SEGUNDA EDIÇÃO DO LIVRO “A TRAGÉDIA DA POLÍTICA EM RICARDO III”

pUBLICAÇÃO DO SITE DO NÚCLEO PRISMA


O Prof. Dr. José Renato Ferraz da Silveira, Coordenador do curso de Relações Internacionais da UFSM e do Núcleo de Pesquisas em Relações Internacionais de Santa Maria (PRISMA), terá a segunda edição de sua obra “A tragédia da política em Ricardo III” lançada pela Azougue Editorial, em parceria com a Livraria Nobel de Santa Maria. O lançamento será realizado no dia 22 de março de 2014, a partir das 17 horas, na Livraria Nobel (2º piso do Royal Plaza Shopping).
O Núcleo PRISMA estende o convite da Azougue Editorial e da Livraria Nobel para prestigiarem o lançamento da segunda edição da obra, “uma ousadia intelectual e um instigante produto acadêmico”.

Mercado de trabalho nas RI

MERCADO DE TRABALHO NA ÁREA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS 

- governo, ou setor público de modo geral, no qual se destaca em primeiro lugar a Diplomacia, mas também todos os demais ministérios e agências públicas, bem como os governos estaduais e municipais através de “assessorias internacionais”;
- academia, através da docência e/ou atividades de pesquisa na área de relações internacionais;
- setor privado, como profissionais de carreira ou consultores tratando de questões que envolvem o cenário internacional;
- setores da sociedade civil, com destaque para as ONGs voltadas para os chamados novos temas em relações internacionais, tais como meio ambiente e direitos humanos.

Características do profissional de excelência em RI

O profissional de excelência em Relações Internacionais deve possuir as seguintes características:

- habilidade em negociações
- espírito empreendedor 
- comunicação efetiva
- capacidade de persuasão
- capacidade organizacional
- habilidade em tomar decisões 
- habilidade em mediar situações de conflito
- busca constante por aperfeiçoamento e atualização
- conhecimento de idiomas
- cultura enciclopédica 

Belo poema

Desconheço o autor, mas muito lindo e reflexivo o poema:

  Há momentos na vida em que sentimos tanto
a falta de alguém que o que mais queremos
é tirar esta pessoa de nossos sonhos
e abraçá-la.

Sonhe com aquilo que você quiser.
Seja o que você quer ser,
porque você possui apenas uma vida
e nela só se tem uma chance
de fazer aquilo que se quer.
  Tenha felicidade bastante para fazê-la doce.
Dificuldades para fazê-la forte.
Tristeza para fazê-la humana.
E esperança suficiente para fazê-la feliz.

As pessoas mais felizes
não têm as melhores coisas.
Elas sabem fazer o melhor
das oportunidades que aparecem
em seus caminhos.
A felicidade aparece para aqueles que choram.
Para aqueles que se machucam.
Para aqueles que buscam e tentam sempre.
E para aqueles que reconhecem
a importância das pessoas que passam por suas vidas.

O futuro mais brilhante
é baseado num passado intensamente vivido.
Você só terá sucesso na vida
quando perdoar os erros
e as decepções do passado.

A vida é curta, mas as emoções que podemos deixar
duram uma eternidade.
A vida não é de se brincar

porque um belo dia se morre.


Crônica, fruto de meu aniversário de 35 anos. 

Três mosqueteiros

Os Três Mosqueteiros é um fantástico romance histórico escrito pelo francês Alexandre Dumas. É o volume inicial de uma trilogia, romanceando fatos importantes dos reinados dos reis Luís XIII e Luís XIV e da Regência que se instaurou na França entre os dois governos.
O livro trata de sentimentos nobres, virtudes, aos homens que serviam aos reis franceses. E de uma forma pontual, revela a força da amizade, do amor entre os amigos, da solidariedade com outro. Amizade é mais que afinidade e envolve mais que afeição. As exigências da amizade – franqueza, sinceridade, aceitar com a mesma seriedade as críticas e os elogios do amigo, lealdade incondicional.
A lealdade é a marca da constância, da solidez dos elos com as pessoas, grupos, instituições e ideais que deliberadamente nos associamos. Recebi em minha noite festiva, no dia 24 de novembro de 2013, o discurso de reconhecimento da lealdade. Lágrimas e mais lágrimas derramaram sobre o meu rosto fatigado por lutas e confrontos diários contra os meus desejos de sucesso.
Naquele momento em que Renan John Brum expressava o carinho e demonstrava ciência do esforço hercúleo de meu trabalho, tive certeza que fiz o necessário para contribuir e fazer a diferença. Palpitações no coração e lágrimas nos olhos brindavam divinamente o amor eterno entre os amigos. Hoje, reconheço que a amizade genuína requer tempo, esforço e trabalho para ser mantida. A amizade é algo profundo. De fato, é uma forma de amor. Shakespeare expressa dignamente esse sentimento divino ao expressar em seu soneto 30: “mas, amigo, se em ti penso um momento, vão-se as penas e acaba o sofrimento”.


José Renato Ferraz da Silveira
Li esse breve texto após receber dez da banca, comovido e emocionado, é sempre bom recordar:

Gostaria de agradecer muito a banca pelas perguntas e pela forma como foi conduzida a defesa. Meu muito obrigado ao Cláudio, Rafael, Carlo e Rosemary.
Confesso e reconheço que os últimos cinco meses, vivi sensações de angústia e sentimentos de desespero aliados a uma inspiração sobre humana similares aos do rei Ricardo II.
De fato, vivi um drama semelhante ao de Ricardo: o conflito entre a vontade e o destino. Evidentemente que a minha luta não é pelo trono, cetro e coroa inglesa, mas a luta por um sonho de sucesso na carreira profissional.
E a data de hoje, dia 03 de novembro é mais uma etapa para que esse sonho e desejo possa se tornar real. Compartilho esse momento decisivo com todos vocês aqui presentes.
Achei oportuno recitar a banca e ao público presente, um trecho da peça Ricardo II, escrita por William Shakespeare em 1595 que considero marcante e que em vários momentos fez me identificar com o personagem Ricardo II.
Eu, não; não, eu; pois um nada terei de ser.
Assim, nenhum “não”, pois abdico em ti.
Agora vê como me desfaço de mim.
Retiro este peso morto da minha cabeça,
Este cetro desmesurado da minha mão,
O orgulho do poder régio do meu coração;
Com a lágrima lavo os óleos,
Com as minhas mãos entrego a coroa,
Com a língua renego o meu reino sagrado,
Com o próprio respirar quebro todos os votos;
Renuncio a toda a pompa e majestade;
Abandono feudos, rendas e rendimentos
Revogo leis, decretos e estatutos.
Deus perdoe os juramentos que me foram violados,
Deus guarde invioláveis os que te fizerem.
Fazei com que nada, que nada tenho, me angustie,
E que tudo a ti, que tudo tiveste, te alegre.
E Ricardo em breve possa jazer numa cova.
Salve, Rei Henrique, diz o destronado Ricardo,
Deus vos dê muitos anos de dias de sol!
Que falta ainda?
Pois esse trecho representa um misto de estado de desamparo, desapego das coisas materiais e de despir o orgulho, a identidade e o sentimento de impotência: não há mais nada a fazer, senão se entregar a roda da Fortuna.
Eu agradeço muito ao Miguel, pela orientação e ao auxílio em diversas situações que foi necessário intervir. Meu muito obrigado.

Agradeço aos meus pais, em especial, minha mãe pelo auxílio material e espiritual que me foi dado durante esses dois anos e três meses. 
Outro momento de intensidade lírica e dramática da peça: 

Por amor de Deus, sentemo-nos no chão
E contemos histórias tristes da morte de reis:
De como uns foram depostos, outros mortos na guerra,
Uns perseguidos pelos fantasmas que tinham deposto,
Outros envenenados pelas esposas, ou mortos
Durante o sono, todos assassinados – pois,
Dentro da Coroa oca que cinge as fontes de um rei,
Tem a Morte a sua corte, onde faz sentar o bobo,
E zomba do poder real num esgar à sua pompa,
Concedendo-lhe um suspiro, uma cena breve,
Para fazer de rei, ser temido e matar com o olhar,
Infunde-lhe um vão conceito de si próprio,
Como se a carne que nos empareda a vida
Fosse imperecível como o bronze; assim divertida,
Para furar as muralhas do castelo e...adeus, rei!
Cobri as cabeças e não mofeis da carne,
Fazendo solenes referências; deitai fora
O respeito, a tradição, fórmulas e etiquetas;
Todo este tempo me entendestes mal.
Vivo de pão como vós, sinto necessidades,
Sinto tristeza, preciso de amigos – carente;
Assim, como podeis dizer-me que sou rei?
(SHAKESPEARE, 2002, p. 90).


Esse trecho da peça Ricardo II é primoroso, a verdadeira queda do rei: 

Eu, não; não, eu; pois um nada terei de ser.
Assim, nenhum “não”, pois abdico em ti.
Agora vê como me desfaço de mim.
Retiro este peso morto da minha cabeça,
Este cetro desmesurado da minha mão,
O orgulho do poder régio do meu coração;
Com a lágrima lavo os óleos,
Com as minhas mãos entrego a coroa,
Com a língua renego o meu reino sagrado,
Com o próprio respirar quebro todos os votos;
Renuncio a toda a pompa e majestade;
Abandono feudos, rendas e rendimentos
Revogo leis, decretos e estatutos.
Deus perdoe os juramentos que me foram violados,
Deus guarde invioláveis os que te fizerem.
Fazei com que nada, que nada tenho, me angustie,
E que tudo a ti, que tudo tiveste, te alegre.
E Ricardo em breve possa jazer numa cova.
Salve, Rei Henrique, diz o destronado Ricardo,
Deus vos dê muitos anos de dias de sol!
Que falta ainda?


Ricardo II, William Shakespeare 
Outra crônica que escrevi há dois anos atrás: 

Amanhã estarei completando trinta e três anos, a chamada idade de Cristo.
Além da idade de CRISTO, 33 é o número de vértebras da coluna vertebral, quantidade de graus simbólicos na Maçonaria dentre inúmeros outros símbolos.
33 representa para mim uma idade de apogeu físico mental - não temos a vitalidade e o ímpeto dos jovens de 20 anos - nem a experiência e o medo de falhar dos 40 anos.
Os 30 anos são o verdadeiro ponto de maturação em que nos preocupamos com a carreira, mas visualizamos oportunidades na vida pessoal e queremos crescer cada vez mais em ambas. Não nos decepcionamos com nossos erros e frustrações. Aprendemos que não devemos confiar cegamente nas pessoas, a não se envolver emocionalmente e a tratar tudo de forma profissional.
A experiência me ensinou a não tornar os problemas maiores do que são. E seguir aprendendo sempre. Reconhecer nossas limitações e tentar aprender ao máximo, encarar nosso defeitos. Ter a mente aberta e a consciência de que não se sabe de tudo é a grande chave do sucesso.

Hoje estou bem consolidado na minha carreira profissional, visualizo novos horizontes e praticamente alcancei grande parte dos meus sonhos e objetivos.

Hoje, amanhã e sempre agradeço aos meus pais, irmãos, amigos e pessoas que passaram como cometas e outras que são estrelas que iluminam meu céu.    O amor está no ar. Essa bela canção dos anos oitenta acalma e tranquiliza o meu espírito dionisíaco.


Há muitos projetos e ideias para 2014 do ponto de vista pessoal e profissional. Uma delas, sem sombra de dúvida, é aumentar as minhas crônicas e uma das quais me orgulho pelo teor sentimental é essa transcrita aqui abaixo: 



INTERVENÇÃO OU INTIMAÇÃO DIVINA

            Gente, fui aprovado!
            Foi aos berros que entrei na cozinha naquela manhã para noticiar a minha entrada como docente em uma Universidade Federal no sul do país. Infelizmente a tática de esperar na cama e aguardar que todos estivessem reunidos para o desjejum dera em nada. No local, junto a pia, encontrava-se apenas minha mãe. Ela cantarolava baixinho.
            Diacho, onde está todo mundo, pensei irritado comigo mesmo por não ter esperado mais um pouco na cama.
Mamãe não disse nada ante minha chegada intempestiva.  Apenas se virou lentamente e fixou os olhos em mim enquanto enxugava, torcia e retorcia as mãos no avental.  Em silêncio. Em choque. Em transe.
 Fiquei incomodado com a reação dela.  Eu que esperava gritos, sorrisos, beijos e abraços, muitos abraços murchei como uma uva passa. Que me importava que o pessoal da casa estivesse dormindo às 11 horas da manhã?  Diante de mim, a principal incentivadora da minha vida profissional estava calada. Nenhum afago. Nenhum sorriso. Nenhuma lágrima. Fiquei incomodado com a reação dela.  Bah, mas quem entende as mulheres?   Ou melhor, quem compreende as mães? Pois naquele exato instante estava eu diante de uma completa estranha. À minha frente estava uma mulher morena, pequena e baixa de olhar sereno e lábios cerrados me olhando. E eu olhando para ela.  Senti que algo ou alguém havia usurpado o corpo daquela que me concebera. Não reconhecia nela aquela mulher guerreira que durante anos me motivara, auxiliara e sacrificara tantas e tantas vezes. Balancei a cabeça atarantado. E veio à mente a conhecida história familiar. Em meados dos anos 78, após conclusão de um curso de especialização no Rio de Janeiro, meu pai cuja alma gaúcha não esconde de ninguém, teve oportunidade de escolha para ser transferido para Santa Maria. Acontece que a senhora gravidíssima do filho que agora escreve não aceitou de jeito nenhum. “Frio, muito frio”. Pelo estado delicado que ela se achava, meio a contragosto, papai buscou satisfazê-la. Arriscou seu futuro. Como era de se esperar, infelizmente, as coisas não deram muito certo na região escolhida. Exatos cinco anos estavam de volta ao interior de São Paulo. Papai nunca se conformou com a infame trajetória.   
            E agora, me encontrava quase na mesma situação. Querem saber, estava encrencado. Por bons motivos. Existe algo pior que não realizar seus sonhos? Antes mesmo de o resultado do concurso público sair eu já sonhava com os lírios dos campos de Veríssimo. Vagava entre as imagens de Vargas, Brizola, Anita Garibaldi e tantos outros guardiães e gáudios da alma gaúcha e brasileira. Via-me nos braços amorosos de uma gentil prenda. Ensaiava uns passos ligeiros do xote, do fandango ao som de um vanerão.  Nas festivas estâncias fazia par com Pantagruel ao me empanturrar de churrasco, vinho e mate.
Mas cá entre nós existe algo pior que desapontar uma mãe? Senhor, não, não podia. Ainda mais a minha tão sensitiva. Meio bruxa, costumávamos eu e meus irmãos falar.   Ninguém conseguia esconder nada dela.  Aproximei-me dela e disse:
- Mamãe, sou um grande idiota. Desculpe-me se a assustei!           
            Ela passou os braços na minha cintura e apertou. Então as lágrimas hibernadas irromperam e deslizaram pelo rosto. Choramos juntos. Antes de a avalanche passar ficamos cercados pelos dorminhocos.
            - O que está acontecendo? Por que mamãe está chorando? O que você fez?
            - Nada! Juro.
            Mamãe com um simples olhar acabou com o alvoroço. E sem largar meu braço disse num tom sério:
            - Ele irá nos deixar.
            - Eu não-não decidi nada ainda, mãe!
             - Ele passou no concurso da UFSM! - bradou minha irmã mais velha num tom exultante.   
            - Tchi! – resmungou meu pai e acrescentou num tom irônico: Sua mãe não vai deixar você ir por causa do frio, da distância e sabe-se-lá os motivos que lhe derem na telha. Eu já aconteço essa história de outros tempos.
            Ela não se abalou. E falou mais ou menos assim:
            - Aí que você se engana meu velho. Ele foi intimado.
            - Intimado? Por quem?
            Mamãe suspirou profundamente. E meus olhos ainda úmidos presenciaram algo inimaginável. Estava do lado de uma giganta. Uma mulher corajosa, otimista, cheia de fé e virtudes. Senti aos trinta anos e com 1,90 de altura um ser pequenino diante dela e de suas palavras:
            - Não esmoreça diante dos sacrifícios, desafios e dificuldades que hão de estar pelos caminhos que irá percorrer. Você estará longe de sua família, amigos e conhecidos apenas fisicamente. Espiritualmente, estaremos sempre ao seu lado. Há um projeto reservado para você. Cumpra com dedicação, solidariedade e amor. Ensine e aprenda. Aprenda e ensine.  Essa noite em sonho Nossa Senhora anunciou sua vitória, meu filho.  Também me disse que eu seria a primeira pessoa que receberia a notícia. Acho que por isso todos dormiram tanto, não é verdade? Vamos cumprimentem seu irmão.
            Enquanto era parabenizado, não tirei os olhos dela. Mas quem pode entender as mulheres? E o coração de mãe? Confesso que as batidas de meu coração estrondeavam dentro do peito. Eu sabia que tudo iria dar certo. E tem dado, graças a Deus.   


José Renato Ferraz da Silveira