terça-feira, 12 de abril de 2011

China, de solução a problema

Clóvis Rossi

Há razoável consenso entre analistas e funcionários do governo de que a China foi importante para a decolagem da economia brasileira no período Lula.
Juntaram-se o pantagruélico apetite chinês por matérias-primas e a excelência brasileira em aéreas como minério de ferro e agricultura para gerar um fluxo comercial que deu dinamismo à economia.
Saltar dos US$ 2 bilhões que era a corrente de comércio (importações e exportações) no ano 2000 para os US$ 56 bilhões de 2010 é todo um acontecimento.
Agora, no entanto, o que era solução começa a virar também um problema. Não que os chineses vão parar de importar. “Não é provável que o relacionamento comercial mude no curto prazo, devido a insaciável demanda chinesa, à construção de obras de infra estrutura no Brasil e na América do Sul voltadas para a Ásia e ao lento ritmo de recuperação da economia nos EUA e na Europa”, escreve, por exemplo, Sean Goforth, professor de economia internacional e blogueiro de América Latina para a Associação de Política Externa.
O problema está dado não pela quantidade do comércio, mas pela sua qualidade. Ou, mais precisamente, pelo fato de que o Brasil é um exportador de matérias primas e importador de bens manufaturados – uma situação que chegou a ser qualificada de “colonial”, em seminário promovido pelo Woodrow Wilson Center exatamente para discutir a relação China/América Latina.
Os números são eloqüentes: dados da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) mostram que 97,5% das importações brasileiras da China em 2010 foram de bens manufaturados, ao passo que só 5% das exportações brasileiras cabem nessa rubrica.
É natural, portanto, que a presidente Dilma Rousseff, na visita que inicia segunda feira, à China, “queira enfatizar muito a questão da reciprocidade”, como antecipa seu assessor Marco Aurélio Garcia.
Ou seja, o Brasil quer exportar bens de mais alto valor agregado. E quer também que os investimentos chineses agreguem valor no Brasil. “Não nos interessam investimentos de caráter predatório”, diz Marco Aurélio. Ou, para simplificar, o Brasil quer que os chineses construam uma siderúrgica em vez de apenas comprar minério de ferro.
É natural, na medida em que a agressividade chinesa, tanto no mercado interno brasileiro como em mercados em que o Brasil compete com a China, agravou muito a situação dos produtores nacionais nos dois últimos anos.
Um estudo da FIESP constatou que, em uma década (até 2009), o Brasil perdeu US$ 18,2 bilhões para os chineses nos dois mais suculentos mercados do mundo (EUA e União Européia).
O levantamento mostrou que 72,8% dos danos ocorreram no biênio mais recente e se distribuíram por 16 setores, o dobro dos que registraram perdas para os chineses em anos anteriores.
Como grande parte dos prejuízos é atribuída ao câmbio chinês muito desvalorizado, “Dilma vai tratar do tema com as autoridades chinesas com a devida elegância, tal como o fez com o presidente Obama, em sua visita ao Brasil”, antecipa também Marco Aurélio.
A elegância será usada também para tocar no delicado tema dos direitos humanos? “Não está na nossa pauta”, diz Marco Aurélio.

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