Feminismo
O feminismo como corrente teórica das Relações Internacionais começa a conquistar relevância com o fim da Guerra Fria, na década de 1980. Até então os temas de “alta política” dominavam os estudos da área, particularmente aqueles referentes à guerra. Segundo J. Ann Ticker, esses são temas relacionados à experiência dos homens, considerados especialistas em assuntos militares, o que implícita ou explicitamente serve como argumento para a exclusão da participação da mulher nos assuntos internacionais(Tickner, 2003). Com o fim da Segunda Guerra, a agenda de estudos em relações internacionais e passa a incorporar temas como conflitos étnicos, globalização, democratização, direitos humanos, feminismo, entre outros.
A reavaliação metodológica e ontológica das Relações Internacionais como campo de pesquisa acadêmica, ocorrida sobretudo a partir da década de 1990, representa outro importante fator. Não apenas temas novos foram incorporados à disciplina como também perspectivas metodológicas diversas daquelas tradicionalmente adotadas pelas ciências sociais. Quase sempre de natureza interdisciplinar, esse foi o caso da abordagem feminista, que utiliza do método hermenêutico, bem como daqueles de cunho histórico e humanístico. Dessa forma, o feminismo encontrou ambiente propício para o questionamento das próprias estruturas sociais, domésticas ou internacionais. Como resultado, o movimento denunciou hierarquias sociais apoiadas sobre a divisão do gênero humano entre homens e mulheres (gênese de sexo).
Feminismo, portanto, pode ser definido como uma vertente da teoria crítica que se ocupa de explicar as relações de desigualdade existentes entre homens e mulheres, as relações econômicas e sociais assimétricas em detrimento de mulheres das mulheres, bem como prescrever soluções para esses males. No âmbito mais específico das relações internacionais, o feminismo se dedica a expor e reinterpretar temas como tráfico de mulheres prostituição, estupro como arma de guerra e intimidação social, participação feminina em assuntos de política externa nos centros de poder e de tomada de decisão, bem como a participação da mulher em temas de política doméstica com influência nos processos de política externa, com eleições e opinião pública. Com freqüência estudiosos feministas se dedicam à análise do papel do indivíduo e de grupos marginalizados nas instâncias várias das Relações Internacionais, temáticas comumente desprezadas pelas principais correntes teóricas das relações internacionais.
O feminismo apresenta várias correntes teóricas, e com elas divergências que se traduzem em visões não raro antagônicas acerca da própria definição das porções homem e mulher, da função da mulher nas relações internacionais e das soluções propostas para os temas que lhe são relevantes. Dentre as principais variantes do feminismo podemos destacar o feminismo liberal, o feminismo radical e o feminismo pós-modernista.
O feminismo liberal é considerado a corrente mais influente do feminismo internacional. Sem prescrever papéis distintos para homens e mulheres, busca soluções legais e institucionais capazes de enfrentar o problema da discriminação e da hierarquia que acaba por desperdiçar talentos femininos. Apenas assim, acreditam os adeptos dessa linha de pensamento, as mulheres teriam maiores oportunidades de participação efetiva em cargos de poder e de decisão na área internacional. A justificativa para tal empreitada seria a melhora quantitativa, e por conseguinte qualitativa, dos quadros de profissionais disponíveis para estudos internacionais, planejamento, execução e avaliação de assuntos ligados à política e à economia internacional.
O feminismo radical, ao contrário, defende a noção de que homens e mulheres possuem características e habilidades distintas como resultado de experiências materiais únicas. Nesse sentido, as mulheres teriam melhor desempenho como negociadoras e mantenedoras da paz, já que tradicionalmente elas cumprem o papel de nutrir e cuidar das novas gerações. Assim, o que se busca com a quebra da divisão do trabalho imposta por homens no poder seria mais do que uma participação igualitária. O que se almeja é a possibilidade de a mulher realizar seus potenciais únicos de maneira plena e assim contribuir para a evolução qualitativa das relações internacionais.
Finalmente, o feminismo pós-modernista critica as vertentes anteriores, pois acredita que a própria divisão do trabalho entre homens e mulheres encerra formas de exercício de poder que não poderão ser resolvidas, seja com uma participação igualitária entre homens e mulheres, seja com a identificação de papéis próprios para a ação feminina. A divisão em si representa uma dualística ocidental, criando divisões estereotipadas e artificiais entre homem e mulher, razão e emoção e, consequentemente, entre grupos sociais vários, domésticos ou internacionais. A ênfase aqui está na relação entre conhecimento e poder, bem como na crítica em busca do conhecimento objetivo, científico. Dessa forma, o que importa é desvendar e questionar o fato de que as teorias e estruturas sociais artificialmente construídas geram privilégios e privilegiados.
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