Ollanta Humala - Lula andino ou Chávez peruano?
DE LIMA - O candidato de esquerda Ollanta Humala se consolidou como líder na campanha eleitoral peruana. Nos últimos levantamentos --que não puderam ser publicados no país, por lei eleitorais que determinam lei-seca de pesquisas a uma semana do pleito-- Humala aparece com 28% dos votos, seguido de Keiko Fujimori com 21%. Keiko é uma populista de direita que é filha do ex-presidente Alberto Fujimori, atalmente cumprindo pena de 25 anos por corrupção e violações de direitos humanos.
Em 2006, quando se enfrentaram no segundo turno Ollanta Humala e o atual presidente Alan García, o Nobel peruano Mario Vargas Llosa comparou a disputa a uma escolha entre "o câncer e a aids". Ontem, ao descrever um possível segundo turno entre Humala e Keiko, afirmou: "seria verdadeiramente uma catástrofe para o Peru."
A grande pergunta que atormenta analistas e parte dos eleitores é a seguinte: Humala realmente se transformou em um candidato mais moderado, ou é apenas "lobo em pele de cordeiro", como acusa seu rival Alejandro Toledo?
Para se tornar mais palatável ao grosso do eleitorado, que teme sua postura agressiva e estatizante, Humala lançou sua versão 2011 - Ollanta Paz e Amor. Para isso, teve ajuda dos petistas Valdemir Garreta e Luís Favre, que atuam na campanha do candidato, que teve direito até a sua "Carta ao povo Peruano", nos moldes da Carta ao povo brasileiro de Lula.
Conversei longamente com Salomon Lerner, o chefe da campanha de Humala. Ele me garante que não se trata apenas de retórica de campanha. "Ollanta amadureceu, abandonou posturas mais radicais que tinha em 2006, nós aprendemos com a história." Humala quer distância de Hugo Chávez, que deu uma rasante no Peru na reta final da eleição passada e enterrou as chances do candidato peruano no segundo turno do pleito de 2006. Assim me garante Salomon, ativista da comunidade judaica que conheceu Humala em 2005, quando o candidato foi acusado de ter posições anti-semitas. Acabaram ficando muito próximos e ele passou a chefiar sua campanha.
Houve, está claro, um "extreme makeover" na imagem de Humala. Está fora o look combatente de selva. Agora, usa ternos bem cortados, ou camisas azuis. Sorri bem mais. Ostenta sua fé católica. No debate, fez tanto esforço para não parecer agressivo, que não entrou em disputa nenhuma com os outros candidatos --e tentou responder muito pouco.
Mas entre os pontos polêmicos, como renegociação de contratos com mineradoras, concessões para as hidroelétricas construídas por empresas brasileiras na Amazônia peruana, reforma da constituição, ele ainda precisa explicar mais. Muito do que propõe, de fato, está em estudos no Brasil e foi feito até no Chile, no caso de aumento de royalties da mineração. Não se rompem contratos. Simplesmente se negocia com as empresas quando terminam os contratos --e, no Peru, grande parte vence em 2012 e 2013. Ou tenta-se adiantar os reajustes, mediante barganhas. Tudo dentro do jogo capitalista.
Dentro da campanha, há a visão de que se deve seguir o modelo brasileiro de engordar o mercado doméstico e não apenas depender de exportação de matérias-primas. E, dentro disso, aumentar as contrapartidas das multinacionais que estão explorando recursos no país --seja por meio de aumento nos royalties, ou exigindo agregação de valor.
O povo peruano quer melhor distribuição de renda e sente-se injustiçado pela exploração dos recursos naturais do país, cujas riquezas não chegam até suas mãos. Mas eles reconhecem que o Peru é uma história de sucesso. A estabilidade macroeconômica construída por Toledo, Alan García e, até, Fujimori, foram muito importantes para o atual crescimento. O desafio é manter a estabilidade, mas agregar políticas sociais.
No caso de Humala, falta muito a ser explicado para que possamos saber se ele está mais para Lula ou mais para Chávez. E as propostas para reforma constitucional, com seus ecos chavistas ou até fujimoristas, ainda assustam.
Patrícia Campos Mello é repórter especial da Folha, Escreve sobre política e economia internacional. Foi correspondente em Washington durante quatro anos, onde cobriu a eleição do presidente Barack Obama, a crise financeira e a guerra do Afeganistão, acompanhando as tropas americanas. Tem mestrado em Economia e Jornalismo pela New York University. É autora dos livros "O Mundo Tem Medo da China" (Mostarda, 2005) e "Índia - da Miséria à Potência" (Planeta, 2008).
Nenhum comentário:
Postar um comentário