segunda-feira, 11 de abril de 2011

Fundo do poço fundo

Fundo do poço fundo

Três acontecimentos da semana passada transportaram a atual crise financeira global (iniciada em 2008) para um novo estagio.

Quebrado, Portugal caiu de joelhos e pediu socorro externo (juntando-se a Grécia e Irlanda). Nos EUA, o governo quase se viu obrigado a fechar museus e zoológicos públicos por conta de impasses orçamentários.

Por fim, o Banco Central Europeu (BCE) elevou, apesar de toda a crise, sua taxa básica de juro para conter a atividade econômica. Por trás do movimento, o risco global da inflação. Ela também já faz estragos no Brasil.

No ano passado, Grécia e Irlanda já haviam sido socorridas com cerca de 80 bilhões de euros (R$ 185 bi) cada com dinheiro europeu e do FMI.

Agora é a vez de Portugal pagar pelos excessos de gastos e financiamentos irresponsáveis a mutuários e consumidores que levaram o mundo à atual crise. O resgate pode custar outros 80 bilhões de euros.

Por fazerem parte da zona do euro e terem a mesma moeda que Alemanha e Franca, essa trinca de quebrados não pode desvalorizar suas divisas e recuperar a atividade econômica aumentando a competitividade de suas exportações.

Logo, terão de cortar na carne, no orçamento, para pagar por esses empréstimos bilionários. É de se esperar mais queda na atividade entre eles, e um prolongamento de sua agonia.

O aumento dos juros na zona do euro (para 1,25% ao ano, com viés de alta) para conter a inflação só piora o quadro geral na Europa.

Na Espanha, outro pais na lista dos "quebráveis", 90% dos financiamentos imobiliários estão atrelados à taxa básica de juros. O aumento de 0,75% nesse indicador esperado para 2011 custara, em media, mais 1.000 euros (R$ 2.300) aos mutuários espanhóis, deprimindo ainda mais a atividade em um pais já com sérios problemas orçamentários.

Esse também é hoje o maior problema dos EUA. Embora seja a primeira das grandes economias avançadas (zona do euro e Japão são as outras) a ensaiar uma recuperação, o governo está deficitário como nunca.

Na semana passada, Barack Obama teve de engolir birras dos adversários republicanos e concordar com um corte de US$ 38 bilhões (R$ 63 bi) para o governo não parar. Nos dias que antecedem o acordo e esperando pelo pior, o governo proibiu o uso de BlackBarries de funcionários em atividades não essenciais para economizar.

Agora, Obama luta para elevar o teto do endividamento americano para o recorde histórico (sob qualquer comparação) de US$ 14,25 trilhões. Para pagar isso, os EUA precisariam do equivalente a quase sete vezes o que o Brasil produziu (seu PIB) em 2010.

Paradoxalmente, mas não tanto, as empresas americanas voltaram a ganhar dinheiro e a Bolsa de Nova York retornou ao patamar pré crise de 2008. O desemprego segue elevado, em 8,8%, mas já esteve acima de 10% no auge dos problemas.

A recuperação se dá justamente porque o governo inundou a praça com dinheiro barato para tirar o país do buraco, se endividando como nunca.

Se o mundo chegou ou não ao fundo do poço da crise de 2008 segue algo difícil de saber.

Certo é que o alto endividamento estatal nos EUA e em vários países europeus segue como imenso quebra-molas no caminho da recuperação.


Fernando Canzian é repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de Brasil e do Painel e correspondente em Washington e Nova York. Ganhou um Prêmio Esso em 2006 e é autor do livro "Desastre Global - Um ano na pior crise desde 1929". Escreve às segundas-feiras na Folha.com.

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