Os medos da Europa com as revoltas no mundo árabe
DE ATENAS
Os acontecimentos no Norte da África e no Oriente Médio despertam dois medos na Europa: que aconteça uma onda migratória e que os novos governos a serem formados depois que a poeira assentar não sejam tão amigáveis, o que é um risco para um mundo tão dependente do petróleo da região.
O segundo medo é apenas balbuciado nos meios políticos. Não pegaria bem levantar senões a revoltas populares contra autocratas sanguinários.
Já bastam as muitas fotos com beijinhos e tapinhas nas costas do egípcio Hosni Mubarak e do líbio Muammar Gaddafi para constranger premiês e presidentes.
Nos meios econômicos, mais preocupados com dinheiro que com a imagem pública, o temor é escancarado, e os mercados jogam o preço do petróleo nas alturas.
A questão da imigração também é tratada bem mais às claras, uma vez que ganha pontos com parte do eleitorado defender uma Europa para os europeus.
Os imigrantes sempre se tornam o bode expiatório quando a Europa vive alguma crise econômica, como acontece agora.
Cerca de 10% da população economicamente ativa do continente (24 milhões de pessoas) está sem emprego. Em alguns casos, o índice de desemprego chega a escandalosos 40% (entre os jovens espanhóis, por exemplo).
Com esse cenário, é fácil culpar o imigrante que, como insistem os jornais sensacionalistas, "roubam os poucos postos disponíveis".
Há sempre o argumento de que eles fazem os serviços menos qualificados, que são rejeitados pelos europeus.
Mas com a política de cortes de gastos públicos adotada por todo o continente, os Estados querem dificultar a vida daqueles que preferem ficar em casa vivendo do seguro-desemprego.
Ou seja, talvez vá ter inglês, espanhol ou italiano branco brigando pela vaga da faxina.
O país mais exaltado por enquanto é a Itália, que geograficamente está mais perto de Tunísia e Líbia e se torna uma porta de entrada óbvia.
O ministro do Interior, Roberto Maroni, membro do nacionalista Partido da Liga Norte, afirma que mais de um milhão devem se aproveitar da turbulência no mundo árabe para fugir para a Europa.
Usa como argumento os cerca de 5.000 que fugiram da Tunísia no início do mês com destino a Lampedusa, ilhota no sul italiano que tem apenas 6.000 habitantes.
Fala em "catástrofe humanitária", "êxodo em proporções bíblicas" e pede socorro a seus parceiros europeus. Quer arrumar um jeito de conter o influxo de pessoas ou forçar os outros países a arcar com parte do contingente.
Seus vizinhos do norte nem querem ouvir falar nisso. A Áustria diz que recebeu mais migrantes que a Itália quando houve a queda dos regimes comunistas do Leste Europeu.
Como naquele final dos anos 80, quando ruiu a cortina de ferro, a Europa percebe mais uma vez que clamar por liberdade e democracia no mundo é bem mais fácil que lidar com as consequências imediatas dessas transformações.
BLOG DA FOLHA DE SÃO PAULO
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